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América Latina em alerta: os efeitos dos cortes da USAID na ajuda humanitária e no meio ambiente

  • Foto do escritor: Valentina Rusnac
    Valentina Rusnac
  • 3 de jun.
  • 4 min de leitura

Atualizado: 1 de ago.


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O fechamento das operações da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) está dando um duro golpe em programas essenciais na América Latina. A medida ameaça a ajuda humanitária na Colômbia, os esforços de preservação da Amazônia no Brasil e as iniciativas contra o narcotráfico no Peru. A interrupção do financiamento internacional já está afetando projetos que combatem a fome, a corrupção e a desigualdade — e pode atingir milhões de pessoas na região, alertam especialistas e organizações sociais.


Entre 2023 e 2024, a USAID destinou cerca de US$1,7 bilhão para a América Latina e o Caribe, segundo dados da plataforma oficial do governo americano, o Foreign Assistance. Os recursos foram aplicados em ONGs, instituições públicas e programas da ONU, com foco especial em países instáveis e violentos, como Colômbia e Haiti.


Colômbia


Na Colômbia, cerca de 25% dos recursos da agência foram direcionados à implementação do acordo de paz de 2016 com as agora extintas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Apesar de representar menos de 1% do PIB colombiano, a ausência desse financiamento já começa a provocar impactos importantes.


Em 2024, a USAID havia aprovado um orçamento de US$413,2 milhões para a Colômbia, divididos em pelo menos 14 áreas. Se a agência for mesmo encerrada, o país corre o risco de perder esse apoio essencial.


É uma decisão drástica, sem precedentes recentes. Gerou muito alarme porque inúmeras organizações comunitárias, rurais e indígenas dependem do trabalho da USAID, afirma David Varela, doutor em relações internacionais pela Universidade Johns Hopkins.

Parte desses recursos também ofereceu ajuda emergencial a mais de 2,8 milhões de venezuelanos que fugiram do colapso econômico no país vizinho. Só em 2024, a agência repassou cerca de US$45 milhões ao Programa Mundial de Alimentos da ONU, direcionados principalmente a essa população refugiada.


Em Bucaramanga, no nordeste da Colômbia, a Fundação Entre Dos Tierras — que atende pessoas em situação de rua e migrantes venezuelanos — precisou fechar as portas.


Está tudo parado por falta de recursos. A situação na cidade só piora, conta Alba Pereira, diretora da entidade. A fundação, que recebia 80% do orçamento da USAID, distribuía cerca de 600 refeições por dia e mantinha 16 funcionários.

A crise humanitária avança em várias frentes. “Mulheres imigrantes grávidas só terão atendimento médico na hora do parto. Não haverá pré-natal nem cuidados durante a gestação”, alerta Pereira, chamando o cenário de “alarmante”.


O impacto econômico também preocupa. “Mais de 75% da ajuda internacional que chega à Colômbia vem da USAID”, afirma o professor Andrés Felipe López, da Universidad de La Sabana.


Peru


No Peru, que recebeu cerca de US$135 milhões da USAID em 2024, ONGs já enfrentam dificuldades para manter programas ligados à segurança alimentar, combate às drogas, geração de empregos, proteção ambiental, saúde pública e fortalecimento da democracia.


Se os cortes continuarem, os programas vão precisar ser drasticamente reduzidos, alerta Susana Chávez, da organização feminista Promsex. E isso num país onde, todos os dias, 47 crianças e adolescentes sofrem violência sexual em casa ou na escola, completa.

Um dos principais focos da USAID no Peru é o combate à produção de coca — planta base da cocaína — por meio da promoção de cultivos alternativos como café e cacau. Esses programas, iniciados nos anos 1980, estão sob risco. O Peru é hoje o segundo maior produtor mundial de cocaína, atrás apenas da Colômbia — que também depende de iniciativas similares financiadas pelos EUA.


Apesar da incerteza, o primeiro-ministro peruano, Gustavo Adrianzén, garantiu que o governo pretende manter os programas de substituição de culturas, mesmo sem apoio dos Estados Unidos.

Na Amazônia peruana, o cenário também preocupa.


O desmatamento, o narcotráfico e a mineração ilegal vão se intensificar, alerta Oswaldo Muca Castizo, coordenador-geral da Organização Nacional dos Povos Indígenas da Amazônia Colombiana (Opiac).

Sem financiamento, jovens indígenas em situação de vulnerabilidade podem acabar recrutados por grupos criminosos que destroem a floresta para expandir o plantio de coca.


Brasil


No Brasil, a USAID atua por meio da Parceria para a Conservação da Biodiversidade Amazônica, voltada à proteção da floresta e à geração de renda para comunidades indígenas. Um dos principais beneficiários é o Conselho Indígena de Roraima, que atua em 35 territórios — incluindo a Terra Indígena Yanomami, a maior do país, com área superior à da Grécia. Com os repasses congelados, projetos de agricultura sustentável, adaptação climática e autonomia indígena estão ameaçados.


Se essa parceria acabar, nossa estrutura fica abalada e perdemos iniciativas essenciais, explica Edinho Macuxi, liderança do conselho.

Nos últimos meses, a entidade já teve que demitir funcionários e suspender atividades por falta de verba.


O apelo pela manutenção dos recursos vai além das fronteiras brasileiras.


Nossa mensagem ao presidente Trump é clara: ele precisa manter esse financiamento, não só aqui, mas em outros países também. Os povos indígenas são os principais guardiões da floresta. Eles garantem a sobrevivência não só dos brasileiros, mas do planeta, reforça Macuxi.

A suspensão das atividades da USAID também interrompeu a atuação do Serviço Florestal dos EUA (USFS) no Brasil, o que impacta o Programa de Manejo Florestal e Prevenção de Incêndios. Essa parceria, firmada em 2021, incluía capacitação de profissionais e estudos técnicos.


O projeto era fruto de uma cooperação entre a Agência Brasileira de Cooperação (ABC) e a USAID, com execução do USFS e de instituições brasileiras.


A suspensão das operações da USAID não afeta diretamente a resposta a incêndios. O impacto maior está na interrupção de iniciativas técnicas que poderiam contribuir para reestruturar instituições brasileiras, especialmente na capacitação profissional, afirmou o Ibama, em nota.

Segundo especialistas, o impacto da saída da USAID varia conforme o país. Ricardo Falcão, ex-funcionário da agência e especialista em financiamento internacional, explica que, no Brasil, a atuação sempre foi mais voltada à área ambiental — e os cortes mais pesados devem atingir países como Bolívia e Paraguai.


No Brasil, o volume de investimento é relativamente pequeno. O impacto real será sentido em outras nações latino-americanas, diz.

Leonardo Letelier, da organização Sitawi, acredita que os efeitos podem ser ainda mais amplos, principalmente com possíveis mudanças na política externa dos EUA.


A USAID tinha um orçamento de cerca de US$30 milhões para o Brasil. Mas, se considerarmos os projetos indiretos e outras mudanças estratégicas do governo americano, o número de organizações afetadas pode ser bem maior, afirma.

Independentemente de futuras revisões, o cenário do financiamento internacional já mudou.


O futuro está claro: haverá cortes no orçamento e redefinição de prioridades. Mesmo que a USAID siga operando, seu foco e volume de investimento serão outros, conclui Letelier.


 
 

A DevelopmentAid é a principal fornecedora mundial de informações para organizações interessadas em desenvolvimento internacional, assistência econômica e humanitária.

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